sábado, dezembro 14, 2024
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Sérgio Freitas foi vítima do mal do início do século

por: Redação

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Diretor operacional da Benfica lutava havia anos contra a depressão. Com sua morte, fica a imagem do chefe admirado pelos subordinados

O bilhete ao lado do corpo não deixa margem para dúvida. São três linhas em letras de forma grandes e hesitantes no alto de uma folha de sulfite: “Que todos me perdoem, mas eu não aguentei mais essa depressão”. Assim, com um disparo de pistola Taurus 380, Sérgio Alexandre Fernandes de Figueiredo Freitas, diretor operacional da Benfica, encerrou a luta que travava havia anos com a doença.

Aos 58 anos, o empresário arrojado e bem sucedido, homem cheio de planos, bom patrão, generoso com os colaboradores, duro nas negociações, tornou-se mais uma vítima do mal do início do século 21.

Havia anos que ele lutava. Mas, nos últimos tempos, a depressão se intensificou, a ponto de interferir na sua rotina profissional. As pessoas mais próximas relatam situações de ausências e queixas. “Ele reclamava, dizia que não estava bem, parecia sempre cansado, às vezes ficava desligado”, conta uma funcionária que trabalhava diretamente com Sérgio em uma de suas empresas. No fim do ano passado, chegou a se afastar do trabalho e havia retomado fazia pouco tempo. Mesmo assim, seus colaboradores mais próximos não imaginavam o desfecho de sua luta.

Chefe admirado

Sérgio é descrito como um chefe atencioso e generoso. Funcionários contam inúmeras situações em que foram ajudados por ele, inclusive em questões trabalhistas e financeiras. Não era dado a brincadeiras, mas era gentil e falava com todos.

Empresário de 58 anos era sócio da empresa desde os 19

Valorizava o ambiente de trabalho. Costumava estimular os colaboradores. Incentivava a realização da festinha que homenageava o funcionário do mês e regularmente reunia um grupo de motoristas para irem almoçar juntos, como forma de estímulo e também para ouvir o que tinham a dizer. Não abria mão da confraternização de fim de ano, que era realizada em dois dias para que todos pudessem participar.

Mas na hora do trabalho era exigente, apesar de justo. Cobrava o desempenho de quem tabalhava diretamente com ele, questionava ideias e projetos, buscava a perfeição. Como negociador, era duro na busca do melhor para a empresa.

Inovador, estava sempre em busca de novas soluções, como em 2000, quando a Benfica tornou-se uma das primeiras empresas de ônibus do Brasil a usar o cartão magnético. Quando sua equipe lhe apresentou a ideia, desafiou os subordinados a provarem que era uma boa iniciativa até ser convencido. 

Decisão tomada

Na manhã da segunda-feira 4 de abril, Sérgio chegou à sede da empresa, no Jardim Paraíso, pouco depois das 9 horas da manhã, como vinha fazendo. Dirigiu-se a sua sala, trancou a porta e, depois de alguns instantes, ouviu-se o disparo. “Ele já veio decidido a fazer o que fez”, opina um funcionário que acompanhou os passos seguintes.

A polícia foi chamada e foi necessário que um homem entrasse pela janela para abrir a porta por dentro. O empresário estava caído no chão, sem vida, sobre a pistola Taurus 380 com que disparou contra a própria cabeça. Na mesa estava o bilhete com o pedido de desculpas. A polícia ainda achou no escritório outra arma, um revólver calibre 38, além de 51 cartuchos de munição, sete deles, deflagrados.

Pai e filho

Em 1977, quando o pai, Alexandre, adotou o nome de Benfica para a pequena empresa de ônibus que havia comprado em Barueri dois anos antes em sociedade com três irmãos, uma das providências que tomou foi tornar Sérgio, aos 19 anos, seu sócio. A partir dali, e ao longo do tempo, Alexandre esforçou-se para preparar o filho para assumir o negócio, o que aconteceria aos poucos a partir do fim da década de 1990. De uns anos para cá, os dois repetiam o mesmo processo com outro Alexandre, filho de Ieda, irmã de Sérgio.

Ao longo desses 40 anos, pai e filho transformaram a pequena frota de poucos ônibus sucateados e algumas kombis que atendia precariamente a cidade numa das maiores empresas de transporte público da Grande São Paulo. Com o tempo, expandiram os negócios para Jandira, Itapevi e Sorocaba.

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Sérgio tinha um cuidado especial com o pai.”Ele se sentia responsável, pensava no futuro do senhor Alexandre”, conta um amigo. “Uma vez lamentou que fazia tempo que o pai não viajava a Portugal e se culpou por isso.”

Coincidentemente, no mesmo dia em que Sérgio morreu, circulou nas redes sociais uma reportagem da revista Carta Capital falando sobre denúncias contra a empresa Transportadora Turística Benfica, de São Caetano do Sul, de propriedade dos irmãos de Alexandre e seus herdeiros.

Insinuações tentaram ligar as acusações contra a viação do ABC ao gesto extremo de Sérgio, mas ele e o pai nunca tiveram nenhuma participação na outra empresa.

Doença silenciosa

A depressão é considerada um dos piores males dos dias atuais. Segundo a Organização Mundial de Saúde (OMS), cerca de 350 milhões de pessoas em todo o mundo são depressivas. No Brasil, pesquisa feita pelo Instituto de Psiquiatria da Universidade São Paulo (USP) mostrou que 18% dos mais de 5 mil entrevistados relatou ter tido um quadro da doença nos últimos 12 meses. A própria OMS considera que em 2030 ela estará em primeiro lugar na lista de enfermidades mais frequentes, à frente do câncer.

A depressão não deixa marcas aparentes, é impossível de ser diagnosticada por exames e frequentemente é confundida com uma tristeza normal. Por isso, os sintomas podem passar despercebidos pelo doente e pelas pessoas que o cercam durante muito tempo.

Um dos problemas para lidar com a enfermidade é que muita gente imagina que se trata apenas de uma fase de tristeza, geralmente provocada por alguma situação traumática. A falta de compreensão pelos outros sobre o que está acontecendo pode levar o paciente a se isolar, agravando seu quadro.

Os sintomas mais comuns são: estado profundo de tristeza, apatia, desinteresse, irritabilidade, abuso do álcool e de outras drogas.

Caso a pessoa não passe por tratamento, existe grande probabilidade haver repetições de episódios depressivos que podem provocar ciclos em que a pessoa sente-se bem mas, após determinado tempo, os sintomas reaparecem.

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