Eleitor não enxerga no vereador o papel de fiscalizar, o que torna câmaras municipais cada vez mais coadjuvantes no cotidiano das cidades
Câmaras municipais onde vereador faz moção de homenagem ao colega da mesma legislatura; ou que os parlamentares aceitam não debater e votar propostas do prefeito, dando a ele autonomia para decidir sozinho com quem vai assinar um convênio. Parecem cenas de uma novela de Dias Gomes, mas são realidade em Barueri e Santana de Parnaíba.
“A Casa é democrática, não posso proibir (esse tipo de propositura). O que fazemos é analisar juridicamente se o projeto está dentro da legalidade, encaminhar para o parecer das comissões e colocar em votação”, justifica o presidente da Câmara Municipal de Barueri, Sebastião Carlos do Nascimento (DEM), o “Carlinhos do Açougue”. Por outro lado, ele não acha adequado a uma câmara fazer uma homenagem oficial de vereador para vereador da mesma legislatura. “Não é normal. A pessoa é merecedora da homenagem, mas acho que se deveria esperar, na mesma legislatura não é condizente. Mas cada vereador que fique com suas decisões”, pontuou.
Abrindo mão de fiscalizar
A Câmara Municipal de Santana de Parnaíba já aprovou, em primeira discussão, projeto do prefeito Elvis Cezar (PSDB) que autoriza a prefeitura a celebrar convênios sem que haja necessidade de votação dos vereadores – atualmente, dentro da função elementar de fiscalização dos parlamentares, todos os convênios precisam passar pelo crivo do Poder Legislativo.
Por falta de quórum na sessão desta semana, na terça-feira, 30/5, o projeto não foi colocado em segunda votação – a proposta deve voltar à pauta na próxima semana, e a julgar pela primeira votação deve ser aprovada e virar lei.
O prefeito Elvis César usa como justificativa no projeto o fato de o Tribunal de Justiça de São Paulo ter já decidido matéria semelhante em favor da prefeitura de Sumaré – decisão que, ao contrário das deliberações de constitucionalidade em terceira instância (via Supremo Tribunal Federal), não determina o “efeito cascata”. Ou seja: nenhuma prefeitura ainda é “obrigada” a adequar sua lei orgânica ao tema. Para o presidente da Câmara de Santana de Parnaíba e vereador da base, Antonio
Marcos Batista Pereira (PSDB), o “Marcos Tonho”, a proposta é legítima, uma vez que não é inconstitucional. “Várias prefeituras já adotaram (a norma). Não há vício de inconstitucionalidade, e também não tira o poder de fiscalização do vereador, já que ele pode a qualquer momento, e de várias formas disponíveis, fazer seu papel de fiscalizar”, opina. “Isso servirá para dar celeridade aos convênios que a prefeitura precisa celebrar, porque enviando à câmara demora alguns dias até voltar ao Executivo. (A norma) não tira a legitimidade do vereador”, complementa.
Eleitor não “enxerga”
Passaria pelo eleitor mudar um pouco esse quadro de ineficiência das funções primordiais do vereador – o que, segundo o cientista político e sociólogo Marcos Agostinho Silva, que atua há mais de 15 anos fazendo pesquisas na região, está longe de acontecer. “Pesquisa recente do Instituto MAS aponta que apenas um em cada cinco eleitores enxerga que a função do vereador é fiscalizar os atos do Poder Executivo”, lembra.
Também com base em pesquisa, ele aponta que o que mais o eleitor espera do vereador é que ele facilite o acesso a um serviço público – e que por isso o perfil de trabalho do parlamentar acaba se moldando a esta realidade. “São as questões ‘paroquiais’. Se esse vereador não conseguir um remédio ou médico, por exemplo, perde voto”, explica Agostinho.
Quanto à intenção do prefeito de Parnaíba de livrar a prefeitura da obrigação de submeter a celebração de convênio aos vereadores, o cientista político acredita que se houver algum questionamento, este ocorrerá independentemente da fiscalização Câmara, “vide a questão da taxa de bombeiros”.
“Olhando pelo lado positivo, (a medida) dá esse poder de agilidade. O lado negativo é a perda deste espaço de questionamento e do debate. Tanto podem passar coisas positivas sem o debate, como podem passar coisas negativas também sem o debate. Essa é a grande questão do fórum democrático que é a Câmara Municipal”, finaliza.