O ano é 2016. Políticos de todo o Brasil estão reunidos numa assembleia de emergência. A Praça dos Três Poderes irá explodir daqui a segundos
Por ter pedido à sua mãe, “só mostra isso quando pensar que chegou a hora, tá?”, e também por desconhecer a idade que você tem nesse instante e o seu sexo, vou te chamar apenas pela primeira sílaba da palavra que me faz teu pai. Sendo assim, Fi, faço questão que veja em tempo presente tudo o que se passa diante dos meus olhos neste agora que pra você já é passado.
O ano é 2016. Políticos de todo o Brasil estão aqui, reunidos numa assembleia de emergência, a fim de sitiar nosso país, em virtude dos incontáveis protestos e atos de desobediência que vêm ocorrendo em todo o território nacional, desde que o golpe de Estado deu a presidência para um ditador. A Praça dos Três Poderes irá explodir daqui pouco menos de quinhentos segundos.
Por cerca de 26 anos, gozamos o período mais longo de liberdade política da nossa história. Como professor, eduquei as minhas turmas pra que fossem autônomas e cada integrante pudesse fazer suas próprias escolhas. Pensava em ser assim também quando me tornasse pai. Juro não ter criado absolutamente nenhuma expectativa em relação a você, à sua sexualidade, aos seus gostos pessoais e nem nada dessas coisas de gente normal. Contigo, apenas queria cumprir o meu papel de ensinar-te a ser uma pessoa ética e a investigar como ser o mais feliz dentro das condições dadas pelas suas características físicas e psicológicas.
A menos que seu corpo tenha alguma dificuldade para movimentar-se, suponho que ninguém te tenha dado um andador quando você era bebê. E desde que também não haja qualquer deficiência intelectual, creio que a sua mãe e quem mais te educa, confere a você o direito de criar e decidir sobre os seus próprios conflitos.
Saiba, Fi, que, por excesso de fórmulas pra se viver, de especialistas em tudo e de religiões maniqueístas e redutoras da condição humana, as multidões desaprenderam a inventar significados às suas vidas, de modo que a liberdade passou a ser interpretada como um peso. Então, parecidos com algum neném que, por conhecer o gosto de andar sem ter fortalecido a sua coluna, graças ao andador, agora não quer mais desgrudar-se dele, gente adulta corre atrás de salvadores, que com sua ideologia fascista, mas discursando em nome da liberdade, conquistam a confiança da população e enriquecem pela ignorância da maioria.
A militância de esquerda, armada por grandes desvios de dinheiro de estatais em toda a América do Sul, organizou o maior ataque dito terrorista de todos os tempos. Já que não existe mais Estado, que sentido há em tudo isso aqui?
O problema é que um traidor deixou vazar aos políticos sobre o atentado e nesse instante todos estão recebendo a notícia. Isso exigiu que eu, o responsável pelo detonador, tivesse que escolher entre salvar os companheiros que instalaram as bombas, mas também os ditadores ou mandar tudo pelos ares. Como optei pelo óbvio, ficarei junto a quem começou tudo isso comigo. Espero que a Claro esteja com sinal bom agora e que você cresça livre e feliz.
Com amor,
Seu pai.