Escola e administração pública têm se esquivado sistematicamente da obrigação com o estudante, que estava sem ir às aulas desde que teve o serviço suspenso
Uma limitar da Justiça garantiu que, finalmente, Nicolas Barroneu, de 13 anos, matriculado na Fieb Dagmar Ribas desde 2016, conseguisse frequentar as aulas em 2023. Estudante do 8º ano no ensino fundamental na Fieb, Nicolas passou a usar cadeira de rodas em 2018 porque suas pernas não dobram mais e, desde então, a família começou uma saga para garantir o acesso do aluno à escola. O adolescente tem uma síndrome chamada artogripose, caracterizada pela falta de movimento das articulações e precisa de transporte adaptado.
Desde então, a mãe começou a receber uma série de negativas sobre o transporte que garantiria o acesso de Nicolas à educação na Fieb. Ao BnR, Janaína contou que, desde então, foram idas e vindas aos diversos órgãos municipais para que a questão fosse tratada de maneira adequada.
Ela já acionou a prefeitura de Barueri, as secretarias municipais de Educação, de Transporte e da Pessoa com Deficiência, o Conselho Tutelar e o Ministério Público. A prefeitura de Barueri disse que a instituição é uma autarquia, que não se trata de entidade de ensino municipal, e que, por isso, não teria responsabilidade sobre o transporte para Nicolas.
Com isso, restou à Janaína procurar a Justiça para garantir ao filho o acesso à educação. “Na Fieb sugeriram que eu tirasse ele de lá e o matriculasse numa escola regular da cidade. Não. Meu filho tem direito à educação de qualidade diferenciada (Fieb) como qualquer outro aluno, e tem direito ao transporte adaptado e não vou desistir disso.”
O fato de a Fieb, criada em 1994, ser uma autarquia, não isenta a responsabilidade do município sobre o direito ao transporte escolar, garantido na Constituição Federal, e previsto nas diretrizes da Pessoa com Deficiência. A lei n° 883, de 21 de fevereiro de 1994, que criou a Fieb, evidência que a autarquia foi criada com aporte financeiro do tesouro municipal. Além disso, a mesma Lei, no parágrafo III, alíneas § 2º, no Artigo 4°, define que “no caso de extinção da Fundação, seus bens e direitos passarão a Integrar o patrimônio do Município.” E no Artigo 5°, a lei define que a Fieb contará com “dotação anualmente consignada no orçamento do Município”, o que, por si só, já caracteriza a autarquia Fieb como municipal.
Além disso, o prefeito Rubens Furlan, em discruso feito no 24° aniversário da instituição, publicado no próprio site da Fieb, se mostrava orgulhoso por ter fundado a escola, ao afirmar que “a Fieb é um troféu de tudo que fizemos”. Em 2022, a fundação se destacou entre as 122 escolas municipais, liderando a lista no Índice de Desenvolvimento da Educação Brasileira 2021 (Ideb), segundo publicação do Jornal de Barueri, o que mais uma vez evidência a natureza de entidade de ensino municipal da Fieb.
O BnR procurou a Fieb e a prefeitura e questionou as sucessivas recusas em disponibilizar o transporte adaptado a Nicolas Barroneu. A Fieb respondeu que “a Fundação Instituto de Educação de Barueri não oferece transporte a nenhum aluno” e que o serviço é disponibilizado apenas pela Prefeitura de Barueri, e oferecido com exclusividade aos alunos da rede municipal de ensino – o que não inclui a Fieb, por ser uma autarquia (administração indireta).
Já a prefeitura, por meio da Secretaria de Comunicação (Secom), respondeu que “a Fieb não oferece transporte escolar a nenhum de seus alunos. O transporte escolar gratuito é ofertado aos alunos da rede municipal de ensino. Como autarquia, a Fieb é uma administração indireta, portanto, regida por regulamento próprio”.
Nenhuma norma, federal, estadual ou municipal, pode se sobrepor à Constituição, que na Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) 9.394/96, no Capítulo III, art. 4º, inciso III, diz que é dever do Estado garantir o “atendimento educacional especializado gratuito aos educandos com necessidades especiais, preferencialmente [e não excluizvamente] na rede regular de ensino”.
Sabendo disso, a mãe de Nicolas afirma que não vai desistir dos direitos dele. “Mas a Fieb parece não entender isso, ou acha que eu não entendo. Sou a mãe que luta pela justiça, pelos direitos, meus, dos meus filhos, ou de quem quer se seja. Eles alegam que pela Fieb ser uma autarquia, eles estão isentos de fornecer este transporte”.
Na última semana, depois de dois meses do início do ano letivo, a Justiça emitiu uma liminar obrigando a prefeitura de Barueri a providenciar o transporte escolar para Nicolas, mas dessa decisão cabe recurso e o medo da mãe é que o direito de Nicolas seja suspenso a qualquer momento. “Todos os anos depois de eu brigar e correr atrás de todos os meios possíveis, ele volta a ser transportado, mas interrompem a qualquer momento, sem aviso prévio, justamente por acharem que é um favor”, explica.
Por hora, Janaina está tranquila com a possibilidade do filho poder frequantar as aulas, mas ainda não está segura de que o direito de Nicolas será respeitado. “A gente sempre soube que eles querem elitizar a Fieb, e esta gestão só reforça isso. A disputa judicial continua. Isso [a liminar] não é garantia que daqui três meses ele vai continuar com o transporte”, conclui.